Autoridade da Concorrência proíbe a operação de concentração entre os grupos Brisa e Auto-Estradas do Atlântico
Comunicado nº 8/2006
A Autoridade da Concorrência (AdC) decidiu proibir a operação de concentração que envolve a aquisição do controlo conjunto das Auto-Estradas do Atlântico (AEA) pela Brisa. Da operação resultaria uma quota de mercado de 100% para o trajecto Lisboa / Leiria (A8) e de 75% para o trajecto Lisboa /Porto (A1). A operação afectaria, directa e indirectamente, cerca de um milhão e 300 mil veículos/mês na A1 e de cerca de 570 mil veículos/mês na A8, segundo dados de 2004.
Ao longo do processo de análise levado a cabo pela Autoridade, que incluiu uma investigação aprofundada, ficou demonstrado que: (i) No trajecto Lisboa/Leiria, onde existem dois concorrentes, passaria a haver um monopólio; (ii) No percurso Lisboa/Porto, não só se reduziria o número de operadores que passaria de três para dois, como um deles – a Brisa – passaria a deter mais de 75% do mercado.
No processo ficou demonstrado também que esta operação poderia resultar em prejuízos para os utilizadores pelo desaparecimento ou redução da pressão concorrencial, sob vários aspectos: (i) Sobre os preços das portagens; (ii) Sobre os serviços prestados ao longo dos percursos indicados, sobre a qualidade e a segurança das vias rodoviárias; (iii) Sobre a melhoria destas infraestruturas no longo prazo, nomeadamente no que se refere ao alargamento e manutenção das vias.
No processo não ficou demonstrado que os ganhos de eficiência pretendidos não possam ser atingidos sem a realização desta operação.
A realização da operação afectaria, num cenário de rede viária futura, tendo em conta previsões de tráfego para 2010, cerca de 2,5 milhões de utilizadores mensais (tráfego médio mensal ponderado por quilómetro), que circulam entre Lisboa e Porto.
Estudos de consultoras internacionais indicam que do tráfego total que utiliza as vias referidas, 30% está sujeito a disputa directa pelas duas concessionárias, o que indica um elevado grau de substituibilidade entre elas.
Sublinhe-se que este é um caso excepcional devido à existência de duas vias semelhantes que vão ligar os dois principais centros urbanos do País, em trajecto paralelo.
A operação notificada:
A operação de concentração notificada consiste na aquisição pela Brisa do controlo conjunto da empresa Auto-Estradas do Atlântico. O grupo Brisa, dedica-se à actividade de construção, exploração e manutenção de auto-estradas, sendo a única empresa concessionária da auto-estrada A1, entre Lisboa e Porto. O grupo Brisa detém, ainda, a auto-estrada Litoral Centro, entre Leiria e Mira, que se encontra em fase de construção.
A Auto-Estrada do Atlântico, dedica-se igualmente à actividade de construção, exploração e manutenção de auto-estradas, detendo em regime de exclusividade a A8, entre Lisboa e Leiria.
Em consequência da operação projectada, o grupo Brisa, que já detém, em exclusividade a concessão da auto-estrada A1 (entre Lisboa e Porto), passaria a deter igualmente, conjuntamente com a Auto-Estradas do Atlântico, a autoestrada A8 (entre Lisboa e Leiria).
Cronologia do processo
A operação em causa foi notificada à Autoridade em 24 de Março de 2005 que, em 4 de Julho de 2005, decidiu dar início a uma fase de investigação aprofundada.
O processo esteve suspenso durante 140 dias úteis por motivos não imputáveis à Autoridade da Concorrência. No decurso do processo a notificante não apresentou qualquer tipo de remédios à AdC. A AdC dedicou a esta operação uma enorme quantidade de recursos, tendo analisado 12 estudos e sendo o processo composto por 15 volumes, o que demonstra a complexidade da operação e a profundidade da análise efectuada.
Impacto da operação
No percurso Lisboa/Leiria, a operação traduzir-se-ia na supressão total da concorrência efectiva, passando apenas a existir um único operador – grupo Brisa – com 100% de quota de mercado. Por outro lado, a A8 integrará o novo corredor IC1, que ligará proximamente Lisboa ao Porto, por auto-estrada, e que compreende, igualmente, o troço da Litoral Centro (entre Leiria e Mira, detido pela Brisa) e o troço da Costa de Prata (entre Mira e Porto, detido pela Aenor). Assim, no percurso Lisboa/Porto, em consequência da operação, o grupo Brisa, que já detém a A1 e a Litoral Centro, passaria ainda a deter a A8, o que equivale a uma redução de três operadores no mercado, para apenas dois – Brisa e Aenor.
Concorrência e Regulação
Embora a actuação das empresas esteja vinculada aos contratos de concessão, sendo por isso objecto de regulação, a actividade de exploração de auto-estradas não deixa de estar sujeita à concorrência. De facto, a lei não exclui qualquer sector, nem mesmo os regulados, da aplicação da s regras da concorrência.
A concorrência existe, desde logo, no momento da disputa pela concessão. Mas, existindo alternativas para o consumidor as empresas passam a sentir pressão concorrencial. De facto, duas concessionárias de infraestruturas semelhantes, para os mesmos percursos podem concorrer: (i) Pelo preço – os preços fixados legalmente dizem apenas respeito ao limite máximo permitido, podendo as concessionárias praticar portagens inferiores aos máximos; (ii) Mesmo aplicando os limites máximos permitidos por lei, as concessionárias são livres de compor cabazes de portagens, diferenciando os preços pelo horário, tipo de veículo ou criando modalidades de “veículo frequente”; (iii) As concessionárias concorrem ainda pela qualidade de serviço no que se refere ao estado do piso, sinalização, serviços concessionados ao longo da via, duração de obras, etc; (iv) Por fim, pode ainda haver concorrência pela melhoria das infraestruturas como o alargamento e manutenção da via.
Assim, embora muitos aspectos sejam regulados pelos contratos de concessão, existe um considerável grau de liberdade das concessionárias para, existindo pressão concorrencial, disputarem o mercado e atrair utilizadores.
Apesar de, no mercado de concessões, ser fundamental a concorrência pelo mercado, no qual o Estado tenta obter as melhores condições em nome dos contribuintes, este caso é especial, pois a concorrência também se manifesta no mercado, por existirem duas vias paralelas.
Decisão da Autoridade
A Autoridade da Concorrência decidiu proibir a operação de concentração notificada, por entender que a operação conduziria à eliminação concorrência no (i) mercado da exploração de auto-estrada no percurso Lisboa/Leiria e à redução significativa da concorrência efectiva no (ii) mercado da exploração de autoestrada no percurso Lisboa/Porto, que culminaria na criação de uma posição dominante nos mercados relevantes, susceptível de criar entraves significativos à concorrência.
Das decisões sobre concentrações da Autoridade da Concorrência cabem recurso extraordinário para o Ministro responsável pela área da Economia e recurso judicial para o Tribunal de Comércio de Lisboa.