AdC emite pela primeira vez em Portugal decisão sancionatória por práticas anticoncorrenciais no mercado laboral
Comunicado 06/2022
29/04/2022
A AdC sancionou pela primeira vez em Portugal uma prática anticoncorrencial no mercado laboral.
Neste caso, foram sancionadas as 31 sociedades desportivas que participaram na edição 2019/2020 da Primeira e Segunda Ligas e a Liga Portuguesa de Futebol Profissional (LPFP) por terem celebrado um acordo restritivo da concorrência que impedia a contratação pelos clubes da Primeira e Segunda Ligas de futebolistas que rescindissem unilateralmente o contrato de trabalho evocando questões provocadas pela pandemia Covid-19.
Designados como acordos de não-contratação, ou de “no-poach”, estão em causa acordos horizontais através dos quais as empresas se comprometem, de forma mútua, a não contratarem ou efetuarem propostas espontâneas aos trabalhadores das empresas com quem estabeleceram o acordo.
A prática de “no-poach” é proibida pela Lei da Concorrência uma vez que limita a autonomia das empresas em definir condições comerciais estratégicas, neste caso, a política de contratação de recursos humanos das empresas, podendo acontecer em qualquer setor do mercado.
A prática é ainda suscetível de afetar os trabalhadores pela redução do poder negocial e do nível salarial e privação da mobilidade laboral.
As sociedades desportivas em causa são:
• Os Belenenses – Sociedade Desportiva de Futebol, SAD,
• Boavista Futebol Clube, Futebol SAD,
• Clube Desportivo das Aves – Futebol, SAD – Sociedade em Liquidação,
• Vitória Futebol Clube, SAD,
• CD Tondela – Futebol SAD,
• Futebol Clube de Famalicão – Futebol SAD,
• Futebol Clube de Paços de Ferreira, SDUQ, Lda.,
• Futebol Clube do Porto, Futebol, SAD,
• Gil Vicente Futebol Clube – Futebol, SDUQ, Lda.,
• Marítimo da Madeira, Futebol, SAD,
• Moreirense Futebol Clube – Futebol, SAD,
• Portimonense Futebol, SAD,
• Rio Ave Futebol Clube – Futebol SDUQ, Lda.,
• Santa Clara Açores – Futebol, SAD,
• Sporting Clube de Braga, Futebol, SAD,
• Sport Lisboa e Benfica, Futebol, SAD,
• Sporting Clube de Portugal – Futebol, SAD,
• Vitória Sport Clube – Futebol, SAD,
• Associação Académica de Coimbra - Organismo Autónomo de Futebol, SDUQ, Lda.,
• Académico de Viseu Futebol Clube – Futebol, SAD,
• Casa Pia Atlético Clube – Futebol SDUQ, Lda.,
• Clube Desportivo da Cova da Piedade – Futebol SAD,
• Clube Desportivo Feirense – Futebol, SAD,
• Clube Desportivo de Mafra – Futebol, SDUQ, Lda.,
• Estoril Praia – Futebol, SAD,
• Futebol Clube de Penafiel, SAD,
• Leixões Sport Clube, Futebol, SAD,
• Sporting Clube da Covilhã – Futebol, SDUQ, Lda.,
• União Desportiva Oliveirense – Futebol, SAD,
• Varzim Sporting Club - Futebol, SDUQ, Lda., e
• União Desportiva Vilafranquense, Futebol SAD,
Através de um acordo de não contratação, as empresas abstêm-se de contratar os trabalhadores umas das outras, deste modo renunciando à concorrência pela aquisição de recursos humanos, para além de privarem os trabalhadores da mobilidade laboral.
Em consequência deste acordo, um jogador que tomasse a iniciativa de terminar o seu contrato por questões provocadas pela pandemia Covid-19, não seria contratado por outro clube da Primeira ou Segunda Ligas de futebol profissional em Portugal.
A investigação permitiu concluir que o objeto do acordo foi o de manter os jogadores vinculados às sociedades desportivas, limitando o incentivo destes em resolver os seus contratos, não visando por isso objetivos de cooperação que pudessem ser considerados como essenciais no contexto da pandemia Covid-19.
O acordo é assim suscetível de reduzir a pressão concorrencial entre as sociedades desportivas visadas, sendo passível de alterar o resultado que seria obtido através do livre jogo concorrencial, substituindo-o por outro que é influenciado, ou mesmo determinado, pela coordenação de comportamento no sentido de restringir a procura no mercado da contratação de jogadores profissionais.
Por outro lado, o acordo era também apto a reduzir a qualidade dos jogos de futebol e, nessa medida, prejudicar os consumidores, por reduzir o ambiente competitivo entre os clubes, impedir a contratação de jogadores que poderiam colmatar lacunas das equipas de futebol e forçar jogadores talentosos a sair do país para continuarem a exercer a sua atividade profissional.
Antecedentes
O processo foi aberto oficiosamente pela AdC em maio de 2020, na sequência de dois comunicados de imprensa emitidos pela LPFP em 7 e 8 de abril que faziam referência a uma deliberação/decisão, adotada por acordo entre os clubes da Primeira Liga, com a participação do Presidente da LPFP, e à qual aderiram os clubes da Segunda Liga, definindo que os mesmos não contratariam jogadores que cessassem unilateralmente o seu vínculo laboral por questões provocadas pela pandemia Covid-19.
Face à natureza e características da prática em apreço, bem como ao potencial prejuízo, grave e irreparável, ou de difícil reparação, decorrente da mesma para o funcionamento concorrencial dos mercados, a AdC determinou, em 26 de maio de 2020, a adoção de medidas cautelares.
Em abril de 2021 a AdC adotou a Nota de Ilicitude (acusação) neste caso, tendo dado a oportunidade a todas as empresas de exercerem o seu direito de audição e defesa, o que foi devidamente considerado na decisão final.
No presente caso, a AdC determinou que a prática cessou com o cumprimento das medidas cautelares.
Mais informações sobre o caso na página eletrónica da AdC.
As sanções
A decisão de sanção resultou numa coima total de cerca de 11,3 milhões de euros.
O total da coima é aplicado da seguinte forma:
Os Belenenses – Sociedade Desportiva de Futebol, SAD | € 135 000 |
Boavista Futebol Clube, Futebol SAD | € 99 000 |
Clube Desportivo das Aves – Futebol, SAD – Sociedade em Liquidação | (não há lugar à aplicação de coima) |
CD Tondela – Futebol SAD | € 139 000 |
Futebol Clube de Famalicão – Futebol SAD | € 192 000 |
Futebol Clube de Paços de Ferreira, SDUQ, Lda. | € 137 000 |
Futebol Clube do Porto, Futebol, SAD | € 2 582 000 |
Gil Vicente Futebol Clube – Futebol, SDUQ, Lda. | € 164 000 |
Marítimo da Madeira, Futebol, SAD | € 199 000 |
Moreirense Futebol Clube – Futebol, SAD | € 152 000 |
Portimonense Futebol, SAD | € 111 000 |
Rio Ave Futebol Clube – Futebol SDUQ, Lda. | € 163 000 |
Santa Clara Açores – Futebol, SAD | € 132 000 |
Sporting Clube de Braga, Futebol, SAD | € 340 000 |
Sport Lisboa e Benfica, Futebol, SAD | € 4 163 000 |
Sporting Clube de Portugal – Futebol, SAD | € 1 666 000 |
Vitória Futebol Clube, SAD | € 3326 |
Vitória Sport Clube – Futebol, SAD | € 506 000 |
Associação Académica de Coimbra - Organismo Autónomo de Futebol, SDUQ, Lda. | € 24 000 |
Académico de Viseu Futebol Clube – Futebol, SAD | € 24 000 |
Casa Pia Atlético Clube – Futebol SDUQ, Lda. | € 8000 |
Clube Desportivo da Cova da Piedade – Futebol SAD | € 32 000 |
Clube Desportivo Feirense – Futebol, SAD | € 22 000 |
Clube Desportivo de Mafra – Futebol, SDUQ, Lda. | € 20 000 |
Estoril Praia – Futebol, SAD | € 27 000 |
Futebol Clube de Penafiel, SAD | € 15 000 |
Leixões Sport Clube, Futebol, SAD | € 19 000 |
Sporting Clube da Covilhã – Futebol, SDUQ, Lda. | € 26 000 |
União Desportiva Oliveirense – Futebol, SAD | € 16 000 |
Varzim Sporting Club - Futebol, SDUQ, Lda. | € 26 000 |
União Desportiva Vilafranquense, Futebol SAD | € 14 000 |
Liga Portuguesa de Futebol Profissional | € 141 000 |
As coimas impostas pela AdC são determinadas pelo volume de negócios das empresas sancionadas nos mercados afetados nos anos da prática. Além disso, de acordo com a Lei da Concorrência, as multas não podem exceder 10% do volume de negócios da empresa no ano anterior à decisão da sanção.
Ao fixar a coima, a AdC tem em conta a gravidade e duração da infração, o grau de participação das empresas na infração, a situação económica das empresas, entre outras circunstâncias, de acordo com as melhores práticas internacionais (ver as Linhas de Orientação da AdC sobre metodologia a aplicar na aplicação de coimas).
As decisões sancionatórias da AdC podem ser objeto de recurso. O recurso não suspende a execução das coimas. As empresas podem solicitar ao Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão que suspenda a execução das decisões se (i) demonstrarem que as mesmas lhes causam um prejuízo considerável e (ii) oferecerem uma garantia efetiva no seu lugar.
Em 2021, a AdC elaborou um Relatório e um Guia de Boas Práticas para prevenção destes acordos de não-contratação de trabalhadores.